A Demonstração de Fluxos de Caixa,
conhecida pela sigla DFC, é uma demonstração contábil cuja divulgação se tornou
obrigatória no Brasil para a maioria das empresas a partir de 2008, a partir da
vigência da Lei n. 11.638/07. Essa demonstração veio para substituir a então
obrigatória DOAR – Demonstração de Origens e Aplicações de Recursos.
Fundamentalmente, seu objetivo é evidenciar de que forma a entidade está
gerando e consumindo caixa, afinal, ter lucro no longo prazo é fundamental, mas
esse lucro precisa se converter em caixa, caso contrário, a empresa pode
enfrentar problemas de liquidez.
Os padrões de elaboração e
divulgação da DFC são definidos pelo Pronunciamento Técnico CPC 03, que
atualmente se encontra na versão R2, aprovada em 2010 pelo CPC e regulamentada
pela CVM, CFC, CMN, ANS e SUSEP. Esse documento, por sua vez, foi elaborado com
base na norma internacional IAS 7 – Statement
of Cash Flows, emitida pelo IASB – International
Accounting Standards Board.
As informações sobre recebimentos
e pagamentos são organizadas na DFC em três grupos. Os fluxos precisam ser
subdivididos de acordo com as atividades que ocorrem em uma empresa:
operacionais, de investimento e de financiamento. Essa classificação deve
seguir as orientações do CPC 03, então, por exemplo, o fluxo decorrente de
vendas de mercadorias e serviços é classificado na atividade operacional; a
saída para adquirir um ativo imobilizado é alocada à atividade de investimento;
e a entrada advinda de um empréstimo bancário é demonstrada na atividade de
financiamento.
Porém, alguns fluxos específicos,
como os relativos a juros e dividendos (incluem-se neste os juros sobre o
capital próprio), são de difícil classificação e, por conta disso, o CPC 03 se
refere a esses fluxos de forma explícita, nos itens 31 a 34. E, tendo em vista
que a relação desses fluxos com as atividades pode ser interpretada de maneira
diferente, tanto o CPC 03 quanto a IAS 7 permitem com que a entidade escolha a
melhor classificação.
De forma resumida, tanto os juros
quanto os dividendos recebidos podem ser classificados tanto na atividade
operacional quanto na atividade de investimento. Por outro lado, os juros e os
dividendos pagos podem ser inseridos na atividade operacional ou na atividade
de financiamento. Claro que não estamos falando de uma instituição financeira,
em que os juros pagos e recebidos são puramente operacionais.
Essas escolhas podem ser vistas
de diferentes perspectivas.
Se você está do lado da empresa,
preparando as demonstrações contábeis, deve ter conhecimento dessas opções e, o
mais importante, fazer uma escolha contábil que retrate o entendimento da
administração sobre a melhor maneira de apresentar tais fluxos. Essa escolha
deve ser divulgada e manter-se ao longo dos períodos contábeis, a menos que a
entidade decida mudar a sua política. Neste caso, deverá seguir as orientações
do CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudanças de Estimativas Contábeis e Erros.
Se está do lado da auditoria
externa, é importante verificar se a empresa está fazendo as escolhas dentro
dos limites do CPC 03, se está divulgando adequadamente tais escolhas e se está
mantendo a consistência em relação às classificações de períodos anteriores
(ou, se mudou de política, verificar se a entidade seguiu adequadamente o CPC
23).
Mas o mais crítico é o papel do
analista, seja ele interno ou externo. Digo isso porque se esse profissional
não souber das opções existentes e não souber identificar quais as opções
escolhidas pela empresa objeto da análise, ele pode estar sendo iludido, por
exemplo, ao realizar comparações entre fluxos de uma mesma empresa ao longo do
tempo (e houver mudança de política entre esses períodos) ou ainda, o mais
provável, ao comparar fluxos de entidades que realizaram escolhas diferentes. E
lembrem-se, estamos falando de recebimentos e pagamentos que, em geral,
costumar ser muito expressivos.
Portanto, da próxima vez que
estiver diante de uma DFC, antes de sair loucamente fazendo análises e
calculando indicadores, questione-se: onde mesmo estão classificados os juros e
dividendos pagos e recebidos? Certamente essa informação trará maior riqueza
para as suas análises e evitará conclusões incoerentes. Bom trabalho!!!
Bruno Meirelles Salotti (brunofea@usp.br)
Prof. Dr. do Departamento de Contabilidade e
Atuária da FEA/USP
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